terça-feira, 13 de julho de 2010

Dói o dia

Ouço barulho de portão. Mas não, não é aqui.

Aqui não há ninguém para chegar, apesar da minha espera.


Aqui é só nó na garganta, pensamento-palavra, sentimento-dor.

É uma alegria triste. Da corda que desgastou.

Do cordão que se rompeu. Mesmo?

É espera sem chegança?


É comigo mesma. Escrevendo direto daqui, donde é beira de palavra, beira de abismo.

Do limite, triste, da compreensão que – jura – tentou. Mas não deu. Não deu?


E dói barriga, e dói músculo que palpita. Dor doída. Doía o dia.


É cansaço, do mundo vasto mundo.

E nem a poesia me salvará.


- Salvação? Mas que bobeira, êita que é tombo besta. Desses que se cai e se levanta.


E se os momentos felizes que criaram raízes?

Sei não.

Se não há água elas mínguam.

Hão de fertilizar o solo que sou para novas fecundações.


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Dói, doía o dia.

Mesmo.


Notícias de um girassol

O girassol é uma flor. Logo, ele é ela.
Peculiar justaposição de elementos antagônicos, essa é sua beleza.

- Eu sou Girassol Volátil. Lhe avisei.

Mas ele, desapercebido, reteve somente a primeira parte do sintagma.
Girassol.
E foi bom enquanto eu era flor.
Era força exuberante, delicadeza amarela cujo núcleo denso carregava histórias, encantos e certezas. Eu era sol.

Mas eis que, como tinha de ser, chegou-me o momento do ocaso.
Volatizei. As certezas se esvaíram. A insegurança brotou. De minha matéria sobrou apenas uma sutil essência que carregava o ser, mas ser disperso, desintegrado no ar de mim, nos ai de nós. Eu era esse agora.

Ele, queria aquele.
E sentiu-se ferido pela instabilidade constituinte das coisas que são.

O movimento que particulariza todo girassol - seja ele de qualquer espécie - é suave e constante. Sendo assim, já posso vislumbrar novo dia. E com ele nascente inaugural de mim. Nova materialidade que desabrocha e se desdobra.

O Girassol Volátil não possui perfume. Pois é, ele não é flor que se cheire.